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Por entre paralelepípedos e buzinas, uma mente inquieta, intrépida e ébria. 

Não eram nem 9h e a vida já se fazia presente com a força de um soco na cara de mãos fechados e cheias de ódio. E o sol, intenso e cortante no meio de uma manhã de inverno. E cadê o inverno? 


Acho que eu gosto do inverno e do frio e de desenterrar casacos de 10 anos atrás e sentir meus pelos arrepiando ao sabor de um vento cortante e raro na ilha que cultua o sal, a praia e. É, talvez um mal dia.


Sento nas cadeiras acolchoadas de um imenso coletivo e parece que meu corpo incinera o couro, as ferragens, o asfalto já quente.  Cabeça, rua, tudo nos mesmos 45 graus de amores frustrados, planos rompidos e cigarro.


E entre mágoas, prazos estourados e ressaca, uma vozinha. Seria minha consciência? 


Era abafada essa vozinha. E também calma, quentinha. Não tórrida como o sol lá fora, mas cálida como um fim de tarde amarelado de um outono qualquer. Era inverno, lembre-se. 


Um vozinha. E, de fato era.


Não, não só o timbre baixo e manso, mas também cabelinhos brancos encarapinhados em um corpinho roliço, num vestidinho com mini flores e um sorriso no olhar, já que ainda usamos máscaras em 2022. 


- Ei, você vai descer? 


Olhei para o lado, e eis que. 


Alguns sorrisos de olhar desmancham toda sorte de impropérios e contratempos. E veja só, a gente passa a vida perseguindo possíveis amores bem amados para encontrar sossego no olhar de uma senhorinha completamente anônima, perdida num tempo/espaço que subverte o capital, as pressões e a filhadaputagem do mundo ao redor.


- Não, minha viagem é longa… 


Ela não disse seu nome. Mas falou. Minutos que poderiam ser dias, mas que correram e me suspenderam desse dia cão. Ela tinha dois filhos, bem mais velhos que eu. Tinha mudado de casa há 34 anos atrás. Viveu um amor que lhe rendeu crias, uma vida e também o desejo de passar mais de duas décadas consigo mesma, apenas. Já pensou 20 anos? 


- Mas eu faço um curso de informática, e faço tantos cursos o quanto meu tempo dá. 


E o tempo rende mesmo com ela, danada. Descobri que ela roda a cidade entre exames médicos, forrós e viagens. Que dança todos os dias, quase. E que tem sido feliz e mulher nesses tempos de maioridade. 


- Eu namoro, e digo que é muito bom ser amada.


E fazem 4 meses que a rotininha da vozinha coube também chamegos, almoços em mais uma família e redescobertas de corpos. 


- E parece que nos conhecemos a tanto tempo…


E era pra mim, pasme.

A senhorinha aparentemente também se pôs a suspensão do tempo. 

E veja só, a gente passa décadas da vida numa busca errante em prol daquela ideia romântica de amor, que preenche, quando duas imensidões podem se conectar e assim se desconectar do tempo/espaço dos smartphones, funções cotidianas e das grandes normas da vida.


Pisquei, e ela, a vozinha, já estava perto da porta de saída.

Engraçado, sigo sem saber seu nome. Mas tem um pedaço de história sua aqui, comigo. A gente se salva na distração, e vence.


Perdi o ponto. E Que bom.

À Caso

Dois goles de cerveja ainda gelavam minhas amídalas quando por ali passei. Sozinho.

Sozinho e sem peso, pela primeira vez depois da vida inteira. Caminhava em meio a 11 milhões de pessoas e me sentia único e particular e parte integrante de um mundo que gira em torno de si diariamente. Metafóricamente, ou não, o mundo faz muito mais spoiller de si mesmo do que gostaria. O que importa na verdade é que, com essa metáfora, aprendi a também girar em torno do meu eixo. Por isso, caminhei sozinho. Todo o dia, realizando a cartografia afetiva de uma cidade que não era minha. Ainda (?)

Já era início de noite e os neons já se destacavam em meio ao concreto. Roxos, lilazes, verdes... iluminavam meus caminhos e me conduziam para o nada. Ao sabor do vento. Ao prazer do acaso. 
E, por acaso, ali parei. Minhas amídalas, outrora resfriadas, clamavam por mais líquido. 
Assim, já tinha um novo objetivo: comprar água. E, ao pensar sobre o quão peculiar era o fato daquele bar parecer uma padaria, vi algo trivialmente improvável. Afinal, porque diabos alguém resolve escrever um best-seller as 21:48h de uma segunda-feira solitária na região mais movimentada da cidade? Um questionamento que definitivamente não mudava muito minha vida ou meus objetivos, no caso comprar água. Adentrei o bar/padaria. E, incrivelmente a janela era a moldura perfeita (e também única passagem de ar) para observar aquele curioso escritor. Assim, por curiosidade, fitei-o. Surpresa: Ele também me fitava. Com olhos de quem reunia toda a serenidade do mundo que gira em torno de si mas que também gira ao redor do sol e ainda é o único vizinho azul de outros astros. Pude perceber ainda a linda barba levemente grisalha que servia de invólucro para um doce sorriso de uma alma sem idade. 
A fila andou. e andou até que chegasse minha vez. E daí, eu andei, até a porta do bar. Olhares ainda se cruzavam. Até que ele, o escritor, sugerisse que me sentasse com ele. O mundo ainda girava até então.
Poucos minutos se passaram e já havia descobrido que o que ele escrevia eram despretensiosas memórias, que tinha um imenso bom gosto para camisetas e que, por acaso, dividímos exatamente a mesma rota afetiva por aquela cinza cidade por todo o dia, separados apenas por uma fração de minutos, minutos estes originários das ditas rotações do planeta azul. Planeta azul que abrigava o estado o qual eu e ele éramos originários, e que por ventura não era o que nos encontrávamos naquele momento. 
Mais minutos se esvairam. Não muitos, mas o suficiente para descobrir mais sobre ele, o escritor. Descobri que ambos morávamos numa ilha, não mais a mesma, e que ele, o escritor, possuía outros tantos gostos e lugares em comum. Frequentamos alguns mesmos espaços, estudamos no mesmo lugar, descobrimos umas dúzias de mesmas músicas, separados mais uma vez e apenas por algumas rotações que ele possuía a mais do que eu.
E dividíamos a segunda cerveja quando nossas mãos se tocaram. O caderno e a caneta foram guardados. Muitos outros risos e olhares foram trocados e, enquanto observava cada um dos 110.000 fios de cabelo encaracolado que ornavam sua tez ele, o escritor, teve o ímpeto de tocar seus lábios nos meus. Sim, o mundo ainda girava. Só que dessa vez ao redor de nós dois. E, sinceramente, não o sentia girar. Levantamos, ainda unidos, e percebi que ele, o escritor, era levemente menor que eu, o que me dava a real sensação de tê-lo por inteiro em meus braços.
Creio que ele também não sentia a rotação do planeta azul. Apenas nos sentíamos. Descobríamos com afinco cada detalhe do território desconhecido do outro, cada marca de história, cada jeito de olhar. E assim, num olhar, o escritor se descobriu encantado com meus olhos tão negros como a noite. E foi assim que me tornei o menino de olhos negros e ele, o rapaz do acaso. 

Acaso. Minhas poucas rotações me fizeram cético a sua existência. Apenas até descobrir ele, o escritor. Descobrir que ele estivera ao meu redor todo o tempo e que ainda era taurino e que ainda tinha o mesmo hábito de andar pelos mesmos lugares sozinho. Sermos sozinhos era apenas uma alegoria dele, o acaso, para nos encontrarmos. Em meio aquelas 11 milhões de pessoas.

E assim passamos aquela noite juntos. E o dia seguinte juntos. E a noite após o dia seguinte juntos. E, por fim, retornamos às nossas ilhas, que já não eram mais a mesma.

E mesmo aqui, na minha ilha, anseio pelo dia em que ele, o acaso, nos presenteie com mais um encontro, leve como os outros presenciais e virtuais. O mundo continuou a girar. Diariamente ao redor de si. 365 vezes no ano. E, num desses recortes de tempo-espaço eu sei que o planeta azul girará novamente ao redor de nós dois. À caso.








Mundo

O mundo dá voltas. Uma volta completa ao redor do seu eixo por dia. 365 voltas por ano.
O mundo, enquanto dá voltas, abriga mais de 6 bilhões de pessoas, abrigadas em alguns continentes, em centenas de países, em milhares de cidades.
Eu giro junto com o mundo, mas não ao redor de mim mesmo.
Ou giro?

Parenteses

Então, eu só gostaria de deixar muito claro que o fato de eu te evocar ao telefone/virtualmente/ telepaticamente em todos os momentos vazios do meu dia não quer dizer absolutamente nada além da minha incessante vontade de ocupar todos os tempos-espaços vagos da minha vida. (com você)

sem título. e criatividade.

 - Caso a falta de inspiração esteja a te incomodar.
Esteja com seu teclado, ou máquina de escrever em mãos. Concentre-se (muito) (mesmo).Após isso, bata com seu crânio nos objetos citados.

Resultado: Surgirão textos na folha-tela. E em sua testa.

hjyu7

Tratado

Correr atras do seu amor é, literalmente, obsoleto
                           (exceto quando persegui-lo está diretamente ligado a sua profissão.Ou sua esquizofrenia.).

                                                                                                                                                                                                   
Método aconselhado:

1 - Localize o referido diante de seus olhos;

2 - Busque uma corda, de maior tamanho possível;

3 - Faça um laço de, aproximadamente, meio metro de diâmetro. Amarre bem (em todos os sentidos);

4 - Lance-a na direção do ser em questão;

5 - Puxe. E sorria delicadamente.

PS: Na efetuação do ato, é possível que seu alvo perca alguns dos dentes (da frente). *
PS 2: Caso falhe, a corda possui outras aplicabilidades. Cinto
                                                                                  Forca
                                                                                       Tereza.
*Efeitos colaterais (e dianteiros) que previnem rachaduras futuras em seu coração.




Atualidade (cíclica)

Sentir

Re sentir

(re) sente?

sinto, mas ressinto.

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